segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

PAPAI-NOEL DO INFERNO


Para o pequenino Ed, o natal sempre foi motivo de muita alegria. Ele acreditava em Papai Noel, porém, nunca teve a glória de vê-lo. E agora, com 8 anos de idade, sonhava em ter essa grande oportunidade de ficar frente a frente com ele.

– Ed, se você não se comportar, o Papai Noel não vai lhe trazer presente – dizia seu pai, toda vez que ele fazia algo de errado.

Entrava ano e saia ano e Ed, todo dia 25 de dezembro acordava cedo e corria até a árvore de natal, que ficava na sala, defronte a lareira onde, segundo a sua mãe, o Papai Noel descia e depositava o presente que ele tanto havia desejado.

Agora, carregando oito precoces primaveras, o pequeno Ed começava a se perguntar quem era o Papai Noel, de onde ele vinha e como ele chegava até sua casa. A noite era 24 de dezembro, e depois de voltarem da celebração de natal e de jantarem os três juntos, Ed olhou para aquele pinheirinho todo colorido, com bolas coloridas, com enfeites de Papai Noel, luzes piscando, um presépio ao pé da árvore, e pensou consigo mesmo: Hoje verei o Papai Noel! Hoje ficarei acordado para vê-lo depositar ali o meu presente. Mas Ed pensou alto, e sua mãe, infelizmente, ouviu seu pensamento.

– Como é mocinho? Nada de ficar acordado hoje à noite – ela o repreendeu. – Saiba que o Papai Noel não gosta que as crianças fiquem acordadas. Alias, vou lembrá-lo de que ele anda por ai à noite, e quando percebe alguma criança acordada começa a fazer barulhos estranhos, como arrastar correntes, e coloca essas crianças em seu saco.

– É verdade, pai? – assustado, ele o interrogou.

– Claro, Ed. Agora vá dormir. Amanhã você terá uma surpresa.

Carregando esse maldito pensamento, Ed deu boa noite aos pais e subiu para o seu quarto, onde tentou dormir. Pensou no que a mãe havia lhe dito e sentiu uma pontada de medo, mas logo, se lembrando da surpresa, abriu um riso. A noite andou, mas Ed não conseguiu pregar os olhos. Lá fora a neve caia lentamente e ali dentro o frio e a angustia não o deixavam pegar no sono. Não se sabia ao certo à hora, sabia-se apenas que era alta madrugada quando, de repente, Ed levantou. Estava decidido: iria esperar o Papai Noel lá embaixo. Veria o bom velhinho pela primeira vez!

Desceu as escadas cuidadosamente e, velado por uma penumbra cálida e fria, não ligou as luzes. Lá embaixo observou a neve cair e, de pijama, ficou em frente à lareira, esperando-o. Minutos se passaram até que, de súbito, o incomodativo barulho de correntes lhe assaltou os ouvidos. Ed se enregelou de medo. Fitou a lareira e escutou um estrondo. Lentamente começou a sair dela uma figura vestida de vermelho, barba branca e com um saco às costas. Ed sorriu, talvez aliviado ao ver o bom – ou mau – velhinho.

– Papai Noel! – estupefato, disse a si mesmo. – Você existe...

A figura de vermelho caminhou até ele e o pegou no colo. Ed estava a centímetros do rosto do Papai Noel. Sentia a respiração do homenzarrão vestido de vermelho que transmitia paz, amor, bondade e... Ilusão! A figura que o segurava não era aquilo que as crianças ou que algum de nós de fato havia de imaginar que fosse.

Com uma das mãos segurou Ed pelo pescoço e colocou-o no chão. Do seu saco extraiu um pequeno machado e, de um golpe só, em meio à escuridão da noite, degolou o pescoço do menino e deixou a cabeça de lado. Depois, com o mesmo machado, fez picadinho de seus membros. Terminado, a figura monstruosa tirou a mascará que cobria seu rosto. Seu aspecto era fantasmagórico. O Papai Noel era do inferno!

Pela manhã os pais de Ed acordaram e foram até a sala. Perceberam que além dos presentes que eles haviam depositado sob a árvore, duas outras caixas jaziam ali. Viram seus nomes sobre elas e entreolharam-se. Abriram os presentes ao mesmo tempo, e quando conseguiram ver o que dentro havia, seus sorrisos rapidamente desapareceram. O pai avistou a cabeça decepada do filho em uma caixa menor, e a mãe, de forma horrenda, os membros do pequenino Ed na caixa maior. O natal macabro acabava ali!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O SONHO QUE JAMAIS DEIXAREI DE SONHAR


O ser humano só morre a partir do momento que deixa de sonhar. Por isso hoje, depois de tanto tempo sem vê-lo, sem tocá-lo, sem senti-lo me abraçando, conservo em minha alma o sonho secreto de ainda reencontrá-lo. Nunca compreendi como a vida pode ser tão ingrata, mas, a partir do momento que ela extrai algo de nossas mãos, começamos a entender que, na verdade, ela apenas quer nos dar uma lição, e que todos os atos não dependem dela, mas sim, de nós mesmos.


Hoje estou aqui, faz frio ao meu redor e, acreditem, me encorajo a estar aqui. Sentada em frente ao mar, nessa areia fina e fofa, olho as ondas que quebram num murmúrio triste de saudade. Lembro-me dele. Sim, lembro-me dele. A saudade é tanta... Vislumbro a praia vazia, o vento que ligeiramente me abraça, me esfria, as gaivotas que dançam no céu, me observando, assim como eu observo a imensidão azul do mar sem fim. Lá no horizonte o sol se punha, devagarzinho, em total solidão. Os últimos raios pincelam a areia da praia, assim como as lágrimas que adornam meu rosto triste.


— Sinto tanta saudade de você! — digo a mim mesma, olhando as águas agitadas.


Subitamente me vem uma imagem longínqua, mas sempre presente, do nosso último encontro. Ele, tão amável e carinhoso, disse-me que jamais queria me perder. Olhei-o e dei-lhe um beijo. Em seguida, ele respirou profundamente e me fitou.


— Quisera eu que o mundo acabasse agora, meu amor.


— Por quê? — perguntei, curiosa.


Ele soltou um riso.


— Assim, desta forma, morreríamos juntos, e nossas almas viajariam para a eternidade, onde ficaríamos perpetuamente unidos, num fim totalmente nosso.


Seu beijo desfez meu riso de repente, mas, enquanto sua boca me possuía, pude sentir algo úmido em meu rosto. Era uma lágrima. A única lágrima que até hoje percebi sair de seus olhos verdes.


Um emaranhado de lembranças avulsas me persegue diuturnamente. É estranho, pois não posso ver o mar. Me lembra ele. Não posso ver o pôr do sol. Me lembra ele. Não posso ouvir a chuva. Me lembra ele. Não posso deitar a cabeça sob o travesseiro. Me lembra... bom, eu não posso nem respirar, pois isso também me lembra ele.


Antes que me esqueça de falar, meu nome é Gabriela, e digo, acima de qualquer coisa, que amo a vida e as pessoas que me amam – nesse momento sinto o cheiro da praia, os sons, o frescor da brisa que me brinda com o seu doce ar de natureza, amor e... saudade!


Contudo hoje, aqui defronte ao mar, recordo os momentos bons que juntos passamos e conservo os sonhos para não deixar cair-me em desgraça. Talvez ele esteja pensando em mim em algum lugar, talvez não. Talvez ele até esteja morto – cruzes, que coisa idiota eu disse!. Não, morto ele jamais estará, pois vive loucamente dentro de mim e sempre viverá.


Espere! Lembrei-me de outra coisa que ele me disse certa vez. Caia uma garoa fina e estávamos caminhando próximo a praia sob um guarda- chuva negro que ele carregava.


— Quando eu morrer, quero que não chore. Transforme as lágrimas em lembranças boas que juntos tivemos. A morte não deve ser o sinal da tristeza, afinal de contas, essa vida é apenas passageira, já a outra, é eterna. Olhe para trás e veja o que eu fui, vivi e fiz.


Agora, lentamente eu me levanto. Enxugo uma lágrima, e tenho certeza que esse é um sonho que jamais deixarei de sonhar, porque sei que ele está me esperando, e que sua morte, apesar de me fazer sofrer, me acalma, pois lá de cima, ele sabe me cuidar.



terça-feira, 23 de novembro de 2010

O TRISTE FIM DO MEU AMIGO CÃO


Calafrios percorrem o meu corpo ao lembrar-me da visão que tive certa vez. A mim mesmo prometi que não contaria esta horripilante história a ninguém, mas, não agüentando ficar-me de boca fechada, resolvi, inocentemente, abri-la.


O fato aconteceu à noite. Estávamos eu e minha amável esposa deleitando-nos num sono tranqüilo quando, de repente, um estrondo me açoitou os ouvidos. Abruptamente arregalei os olhos. A principio julguei ser o vento brincando com as árvores ou com a madeira da casa, mas, depois de aguçar melhor os sentidos, compreendi que o vento não era. Primeiro ouvi passos apressados contornando nossa casa, em seguida barulhos de parafernálias espatifando-se no chão, até que ouvi, então, um maldito e sinistro silêncio.


O que ouvi em seguida foi os fervorosos latidos de Busi, meu adorável cão, que ficava em uma casinha nos fundos de nossa propriedade. Pensei em levantar, mas aguardei. Para meu espanto, Busi começou a latir mais alto e desesperadamente, até que, aos poucos, seus latidos foram se abafando, sumindo, até que levemente se tornaram apenas murmúrios se súplica, como se alguém o tivesse fazendo mal.


O silencio novamente pairou. Busi havia se calado.


Tentando compreender o que de fato havia acontecido lá fora, sai da cama e peguei uma lanterna na dispensa. Ao sair, uma lufada de vento me golpeou a face, assim como a amarga e fantasmagórica escuridão. Ao longe, alguns metros a minha frente, distingui os contornos da casa do meu velho amigo canino, mas, surpreendentemente, não o vi.


Resolvi me aproximar. Caminhei a passos lentos até a sua casinha – atento, é claro, a qualquer mínimo barulho que porventura pudesse distrair-me. Aos poucos os meus olhos foram se acostumando com a penumbra e, quando finalmente conseguiram ver alguma coisa, estupefatos ficaram assim que enquadraram a silhueta de Busi, deitado a minha frente. Acautelei-me nos passos e forcei a visão. Sim, era o meu amigo cão!


— Busi! — Chamei-o. — Venha cá amigão.


Ele não se mexeu. Suas orelhas permaneceram inertes. Fui chegando cada vez mais perto, e detive-me finalmente quando entendi que a situação e o estado em que ele se encontrava era assustador. Talvez você, assim como os policiais, não acredite nessa história, mas eu digo, foi assustador! Quase vomitei. Minhas pernas falharam e meu coração acelerou ao vê-lo ali. Busi estava morto, aberto ao meio, sem suas entranhas, sem seus órgãos, como se alguém os tivesse arrancado com a mão, ou até mesmo com dentadas.


Fiquei parado, pasmo, sem saber o que fazer. Aquela estranha e nojenta visão de sangue e vísceras me causaram náusea e quase desmaiei. Tapei a boca com uma mão e com a outra segurava a lanterna, que subitamente resvalou de meus dedos e caiu na grama úmida da noite. Agachei-me para pegar e, quando comecei a exercer esse procedimento, ouvi passos lentos vindos do meu lado direito. Estanquei. Ouvi uma forte respiração. Havia alguém ali junto de mim. Rapidamente peguei a lanterna e virei-me em direção aos passos. Foquei diretamente na face de alguém. Meu sangue gelou. Era um homem. Um homem com a boca cheia de sangue, escorrendo por seu pescoço e camisa. Olhei em sua mão direita e distingui algo sanguinolento. Era algum órgão de Busi. O homem havia comido meu cão com os próprios dentes! Não pensei duas vezes. Comecei a correr até minha casa, com o rastro do maldito as minhas costas. Quando cheguei, fechei a porta e deixei-o lá fora.


No outro dia contatei a policia. Quando fui mostrar o estado do meu cão a eles, uma surpresa: Busi havia desaparecido. Ninguém nunca acreditou nessa história, mas garanto, mais do que tudo nessa vida, você acreditando ou não, que ela é verídica.



sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O ESPANTO DA BELEZA


A beleza de uma mulher feliz sorrindo não se equipara à beleza de uma mulher triste derramando uma lágrima. Foi com essas palavras que conheci Beatrice Aguillar, aquela que seria, por muitos anos, a mulher que faria os meus desejos.


Lembro-me que, na noite em que a conheci, fazia um frio estridente, daqueles que congelam até a memória. Entrei no bar assim que percebi que precisava de alguma bebida. Sentei numa mesa qualquer e esperei o garçom vim me atender. Solicitei um café e, enquanto olhava o vento lúgubre varrer a cidade com sua passagem, de súbito ouvi um leve ruído invadir-me os ouvidos. Olhei em minha volta e nada percebi, mas quando agucei os olhos, surpreendentemente percebi que atrás de mim havia uma salinha, dessas destinadas a fumantes e amantes. Dentro dela, sentada em uma cadeira, adivinhava-se uma silhueta trêmula e triste. Era uma mulher. Uma mulher que chorava lenta e nervosamente.


Levantei e deslizei-me até lá. Em pé, diante dela, proferi apenas uma frase:


A beleza de uma mulher feliz sorrindo não se equipara à beleza de uma mulher triste derramando uma lágrima.


Lentamente ele secou algumas lágrimas que riscavam sua face e foi erguendo a cabeça. Quando me fitou, tive um choque, tamanha era a sua beleza. Contemplei diante de mim aquela boca salgada do choro, aquele rosto com algumas sardas, o cabelo castanho – e não menos diferente –, aquela maravilha de olhar, jogado a mim por um par de olhos verdes tão lindos, que julguei jamais ter outros tão maravilhosos na face da terra. As lágrimas ardiam ao sair de seus olhos, desciam calma e lindamente. Tive que desprender um riso.


— Desculpe-me. Me chamo Beatrice. Beatrice Aguillar — apresentou-se a mim.


O café ficou sobre a minha mesa, esfriando, esperando, contemplando, quiçá, a beleza que eu também contemplava. Foi assim que Beatrice e eu nos conhecemos.


Mas o que quero aqui relatar, em especial, é sobre o dia em que percebi como as mulheres são perfeitas. Certa noite, em sua casa, depois de uma noite de amor ardente, tive a graça de acompanhar, deitado sobre a cama, cada parte de pele do corpo de minha amada. Beatrice saiu do banho com uma toalha branca. Seus cabelos, que tinham mais de encaracolados do que de lisos, estavam caídos sobre seus ombros nus. A água do chuveiro ainda descia pelo seu pescoço, morrendo lentamente em seus seios. Com o rosto lindo, liso, contemplei quando ela abriu o guarda-roupa, ficando de costas para mim. Fitei o fio da coluna onde muitas vezes deslizei minhas mãos, acariciando-a furiosamente, os cabelos que caiam por sobre a toalha, as pernas lisas, e também molhadas, que volta e meia sentiam alguma gota d’agua descer... Eu estava maravilhado com a beleza feminina!


De repente, sem que eu esperasse, Beatrice, ainda de costas para mim, tirou a toalha e jogou-a no chão. Diante de meus olhos externava-se suas lindas nádegas. Fui descendo o olhar pelas coxas, descendo e parando nos pés, onde unhas lindamente pintadas agraciavam meu olhar. Depois, para completar, ela virou-se para mim, deixando-me louco. Que rosto! Quanta beleza, meu Deus! Seus seios igualmente macios, seu ventre liso. Ah, a cintura que tanto segurei, entrelaçando-a com as mãos! Meu olhar foi descendo, descendo, descendo até chegar nas esplendida flor do seu corpo. Não agüentei. Fui caminhando até Beatrice e tomei-a pelo rosto. Uma mão em cada lado, acariciando suas bochechas e fitando seus olhos, sua boa. Sorri e ela me sorriu. Lembrei-me de como tudo é estranho e perguntei-me se, de fato, algum dia realmente ficaríamos juntos, mas esqueci, como num lapso de memória, que essa é um pergunta que ficará perpetuamente sem reposta. Feito isso, soltei:


— Você é a mais pura das belezas, seja sorrindo, seja chorando.



sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O FANTASMA DE ARIELLA



Se tem uma coisa que Ariella e Maria sempre preservaram era a amizade. Para elas, acima de tudo, persistia a amizade. Tanto que até o medo de uma perder a outra as abalava.


— Jamais deixaremos de ser amigas — disse Maria, certa noite.


O fato é que o inesperado um dia iria acontecer. Ariella passaria o final de semana na casa de sua avó, por isso foi até a casa da amiga se despedir.


— Boa viagem — disse Maria ao abraçá-la. — E se cuide.


Depois que saiu da casa de Maria, Ariella se despediu do namorado, que era um rapaz alto, forte e com feições belas, cujos atributos deixavam todas as meninas do bairro a ponto de explodir, inclusive Maria. Ariella tinha ciúmes de Nicolas, por isso dizia que mesmo que a morte a golpeasse, ela não ficaria feliz em vê-lo com outra.


Mas o destino fez com que o ônibus que Ariella viajava abalroasse com um caminhão que trafegava em alta velocidade e, infelizmente, ela tinha sido uma das vitimas fatais do acidente. Morrera na hora. Seus amigos, Maria, Nicolas e todos aqueles que aprenderam a amá-la, não aceitavam o fato dela ter morrido, mas, mesmo que as lágrimas saíssem desesperadas, não adiantava, ela estava morta e nada faria com que ela voltasse.


Nicolas ficara muito sentido com a morte da namorada, e Maria, como era a melhor amiga de Ariella, pôs-se a consolar o rapaz, que repentinamente acabou se apegando a ela. Maria, que jamais se imaginou ficando com Nicolas, deixou de lado esse pensamento e foi se entregando a ele. O primeiro beijo aconteceu dois dias depois do falecimento de Ariella. Depois disso, ambos começaram a se encontrar, primeiro furtivamente, depois, em público. Mas o fato de estarem juntos trouxe a eles alguns fatos desgostosos e estranhos. Certa noite, quando Nicolas dirigia seu veiculo por uma rodovia, jurou ver pelo retrovisor Ariella sentada no banco de trás. Maria assustou-se e disse que isso era bobagem e que só poderia ser coisa de sua cabeça. Mas o primeiro fato fantasmagórico que aconteceu com Maria foi torturante. Ela estava no quarto e ouviu uma risada, depois um arrepio em sua nuca. Deitada na cama, não percebeu nada, foi tudo tão rápido, e só sentiu quando duas mãos tentavam estrangulá-la. Seu pai entrou no quarto e perguntou o que ela tinha.


— Alguma... — disse ela, recuperando-se. — Alguma coisa...


De fato o fantasma de Ariella estava ali. No cemitério um túmulo estava vazio. Uma tumba jazia desfeita, deixando a vista um buraco. Ariella saíra do seu túmulo e começava a caminhar como um zumbi. Seu caminhar hesitante, seu olhar petrificado e seu pensamento alinhado. Quando chegou na casa de Maria, apenas queria pegá-la e levá-la consigo. No quarto ela parou em frente à cama, a centímetros do rosto de Maria. Olhou para ela e calou-a com a mão. Maria se debatia, mas a força de Ariella era mais forte. Os olhos esbugalhados estampavam o terror no rosto de Maria, que logo calou-se, desmaiada.

Justificar

Ariella, o zumbi, o fantasma, o demônio, pegou Maria, aquela que era a sua melhor amiga, pelos cabelos e arrastou-a pelas ruas da cidade até o cemitério. Quando chegou em sua tumba, no buraco que a esperava, ela percebeu que Maria ia acordando. Tentou se desvencilhar dos braços de Ariella, mas a força dela não a deixava. No céu, uma tempestade descia com fúria, e o terror se completava com o ódio de Ariella e com o medo de Maria. Rapidamente Ariella foi entrando em seu túmulo, levando consigo Maria.


Dentro da tumba, a terra foi enterrando Ariella, já acostumada com o seu lugar e Maria, viva, vendo a morte chegar da pior maneira possível. Ariella riu e olhou para Maria.


— Eu disse que viria pegar quem ficasse com meu namorado.


A terra as enterrou. A chuva caia e a sepultura de Ariella agora tinha dois corpos.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O SEGREDO PERPÉTUO


Todos nós temos um segredo escondido em algum canto de nossa alma. Esse que aqui relatarei é o meu, e por mais que eu diga que seja a fatia da minha vida mais recheada de infortúnio, ele sempre será o meu desassossegado segredo.


Antes de começar a lhes contar como se inicia a minha morte — sim, digo morte porque a partir daqueles dias as trevas vieram me abraçar e hoje vivo em uma perpétua tumba de segredos, onde uma teia de sonhos impossíveis me consome — quero me apresentar. Chamo-me Clara e moro no sul da Irlanda, onde vivo com minhas três filhas.


Conheci meu esposo aos 16 anos num casamento de uma amiga. Naquela noite eu disse a minha irmã que um dia me casaria com ele. Ela riu e chamou-me de louca. Dias depois, uma das minhas amigas o pediu em namoro e ele aceitou. Tudo havia desabado. Mas, depois de um ano e muitas brigas entre os dois, ele começou a freqüentar minha casa, e um dia, surpreendentemente, ele veio falar comigo. Pediu-me em namoro e eu aceitei. Namoramos por um ano e meio e depois nos casamos. Em menos de dois anos eu já tinha duas filhas e, cerca 2 anos mais tarde, minha filha caçula nasceu.


Vivíamos uma vida sem maiores problemas. Mas, quando eu tive minha terceira filha, os problemas apareceram. Um belo dia ele disse-me que estava apaixonado por outra mulher. Eu me lembro de ter chorado muito. Meu mundo havia caído. No dia seguinte, desesperada, peguei minha filha de 2 anos e cheguei perto da janela do nosso apartamento no 10º andar, e só não pulei por que um anjo tocou a campainha. Minha irmã. Quando ele chegou mais tarde, disse estar arrependido, mas o estrago já estava feito.


Durante os anos que se seguiram eu sofri muito com as traições dele. Aí, com o tempo, vieram outras crises, e finalmente resolvemos nos separar. Foi neste período de separação e dor que conheci outra pessoa e me apaixonei. Com ele vivi dias de muita felicidade e emoção. Nunca havia conhecido alguém tão especial. Vivemos juntos por um ano. Mas, meu ex-marido foi ficando doente, e novamente disse estar arrependido As minhas filhas tinham ficado com ele, pois eu não tinha condições de sustentá-las, e viram ele tentar se matar, situação que obrigou elas a implorarem pelo meu retorno à casa. Ele chegou até a falar em ir embora do país com elas, sem jamais me dar noticias.


Lembro-me bem do dia que eu estava saindo da casa onde eu estava. Era como se eu estivesse indo para um enterro. O meu próprio enterro! Eu não conseguia falar. Fiz as malas, entrei no carro e deixei para trás a única pessoa que realmente amei nessa vida. Durante os anos que se seguiram, minha vida foi um inferno. Fiquei meio amarga e seca. Porém, muita água rolou e nunca tive coragem de lutar pelo que eu queria. Deixei a vida passar e meu marido acabou se tornando apenas meu amigo. Lógico, nunca esqueci o outro e ele também nunca me esqueceu. Às vezes nos falamos, e lá se vão onze anos de amor que nem à distância e o tempo conseguiram diminuir. Já tentei esquecê-lo, mas o destino, ou sei lá o quê, sempre faz com que a gente acabe se encontrando. Sei que tive que escolher entre minhas filhas e o grande amor da minha vida, e eu não podia abandoná-las.


Aprendi a abrir mão dos próprios sonhos por um bem maior. Hoje vivo com este segredo e ninguém entende quando eu derramo lágrimas de repente, como também não entendem quando estou trasbordando de alegria. Talvez um dia minha vida mude novamente, mas até lá vou deixar as coisas acontecerem. Elas sempre acontecem...


OBS: Essa é uma história verídica, mas o nome da protagonista — que a mim relatou a sua história —, é fictício.


segunda-feira, 13 de setembro de 2010

PESADELO NOTURNO



A rodovia por onde trafegavam era deserta, sem casas ou postos de gasolina na beirada da estrada, apenas mato e floresta. Raphael conduzia o veículo branco acompanhado de quatro meninas – Isadora, Letícia, Gaby e Luana. A luz do dia havia desaparecido, e agora a escuridão da noite, seguida de uma fina camada de névoa, os acompanhava.


— Será que estamos longe? — perguntou Letícia, que estava no banco da frente.


Raphael, sério e compenetrado na direção do veiculo, não deu atenção e permaneceu olhando para frente. No banco de trás, as meninas tagarelavam sem parar. Por quase duas horas andaram sem mudar o ritmo das coisas, até que, em determinada altura da viagem, Gaby observou algo apavorante.


— Gente, vocês viram isso?


— Isso o quê, Gaby? — perguntou Isadora, a mais brincalhona das meninas.


— Meu Deus! Será que só fui que vi. Tinha um cachorro pendurado na cerca lá atrás. Ele estava aberto no meio... — ela ficou séria e todos a olharam.


Talvez eles até não tenham acreditado nela, mas o fato é que, minutos depois, ao parar o carro por causa de um pneu furado, eles, quem sabe, acreditariam.


— Mas que coisa... Tinha que furar justamente agora?! — disse Raphael.


— Ai gente, preciso de um banheiro.


— Mas vai no mato, Luana — sugeriu Isadora.


Minutos depois, um grito ecoou. Todos correram em direção ao lugar onde Luana estava. Quando lá chegaram, viram o horror estampado. Ela estava nua, tinha sido esfaqueada e sangue cobria todo o seu corpo. As meninas gritaram e Raphael levou a mão à boca. Eles não estavam sós! Quando voltaram para a estrada, se depararam com algo, talvez, ainda mais assustador. No capô do veículo branco, um cachorro estava morto e aberto ao meio. Sobre ele jazia uma placa com a seguinte inscrição: Vocês não estão a sós!


— O mesmo cachorro de antes! — Gaby lembrou-se dos quilômetros atrás.


— Meu deus! — disse Raphael.


— Quem será que fez isso? — perguntou Letícia.


Gaby e Isadora se entreolharam, e nisso, perturbadas com a imagem que viam e com o que podia acontecer, começaram a correr floresta adentro. Invadiram a mata densa a fim de sumir dali e daquele horror. Raphael tentou impedi-las e correu atrás delas.


— Leti, fiquei ai. Não sai! — disse ele correndo de costas.


Poucos metros depois ele alcançou Isadora e a segurou. Gaby tinha sumido no meio da floresta. Raphael levou Isadora para a estrada, onde Letícia os esperava. Quando chegaram próximo ao carro, observaram o pior. Letícia estava deitada no chão, sem a cabeça. Isadora fez menção em vomitar, mas, antes de fazê-lo, um grito longo se ouviu no meio da escuridão da mata. Era o grito de Gaby, a terceira menina a ser morta.


Ali, Raphael e Isadora não sabiam o que fazer, nem para onde ir. As meninas estavam mortas, o carro estava destruído, e alguém queria matá-los. Pensando em o que fazer – e apavorados –, Raphael sentiu quando um barulho de botas vinha de suas costas. Ambos se viraram. Isadora gritou. Do meio da escuridão da rodovia estava um homem com uma máscara de frente para eles. Seus olhos eram negros. Munia-se de uma foice, e não demorou muito para degolar Raphael e fazer picadinhos de Isadora. Pronto. Todos mortos.


Acordei no meio da noite. O pesadelo tinha me golpeado. Liguei para Raphael e pedi se ele estava bem e se as meninas estavam em casa. Ele disse que sim e pediu o que eu tinha. Sem titubear, disse que tinha sonhado que todos eles tinham sido assassinados.


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

A NOITE DO LOBISOMEM




Na noite mais amaldiçoada do ano de 1789, um vento intenso e nervoso balançava os galhos das árvores de um pequeno vilarejo, enquanto no céu a lua cheia ardia e iluminava todos os casebres. E, em uma daquelas casas se ouvia o martelar de alguma coisa sobre uma bigorna, onde se desenvolvia algo a fogo ardente. O que seria? Alfred estava cansado e suado diante das chamas. Pensava em aniquilá-lo de uma vez por todas.


Sim, Alfred estava se preparando para matar o lobisomem que o havia atacado.


De repente ele ouviu batidas na porta. Parou de martelar.


— Alfred — alguém o chamava. — Abra. É Marion.


Dirigiu-se até a porta e a abriu. Marion era um antigo amigo de infância.


— O que aconteceu?


— Ele me seguiu. Ele me seguiu, Marion!


— Ele quem?


— O lobisomem — Alfred olhou dentro dos olhos do amigo antes de dizer.


Marion ficou mudo. Ele sabia da lenda do lobisomem. Ele conhecia a história.


— Mas... O que você está fazendo?


— Uma bala de prata.


Alfred havia sido perseguido por uma criatura que julgou ser um lobisomem. Tinha dentes e garras afiadas, pêlos longos e um corpo corcunda, com as omoplatas avantajadas. Ele havia conseguido escapar, e agora preparava à bala de prata que o destruiria.


Mas, aquela noite teria muita coisa para apresentar a Alfred. Apaixonado por Victória, ele jamais imaginou que o terror se instalaria entre eles. Foi na busca pelo lobisomem que ele descobriu que havia algo errado na casa de Victoria. Chegando lá, ouviu um ruído estranho. Era o lobisomem. Ele se preparou, tentou se livrar do medo e entrou na casa. No corredor deu de cara com os pais de Victoria. Ambos haviam sido violentamente mortos. A criatura havia destruído a pele deles com arranhões e comido todos os órgãos e partes do corpo. Alfred ficou pasmo e seguiu o barulho. Quando chegou no quarto dela, os avistou. Victoria estava deitada na cama, ensangüentada, e, por sorte, Alfred chegou a tempo de impedir que criatura a atacasse.


— Saia daí seu demônio — gritou e apontou a arma para o lobisomem.


Ele partiu pra cima de Alfred, que não pensou. Atirou. A bala de prata entrou queimando no peito da criatura, que aos poucos foi voltando ao normal. Para a surpresa de Alfred, o lobisomem era seu amigo. Era Marion. Sim, a maldição havia lhe fisgado. Ele era o sétimo filho de uma família de seis irmãs. Ou seja, o sétimo homem é um lobisomem.


Meses depois, Victória descobriu que estava grávida. As dores e as náuseas a levam a crer que sim. Ela dá a luz a um menino pálido e magro, cujo nome dado ele é Tyler.


Sim, ele é filho do lobisomem. Filho de Marion!


13 anos depois uma criança corre pela floresta. É noite de lua cheia e ela percebe que seu sangue borbulha e que algo a incomoda. A lua grita e ela corre até uma encruzilhada. O seu sangue não agüenta mais. Ela não agüenta mais. A lua lhe observa. A dor vem lhe agredir. Esta doendo. Seus ossos se alongam violentamente e mudam de forma, movendo-se tão drasticamente que chegam a romper sua pele. Aos poucos ela começa pinicar e o sangue a correr furioso nas veias. Levantando as orelhas, ela escuta a lua uivante. É ai que, tomado pela forma de uma maldição, o jovem Tyler, fruto da relação entre Victória e Marion, se transforma em lobisomem pela primeira vez em sua vida.


Tyler uiva para a lua. Seu uivo voa longe e ele começa a correr para a mata.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A NOITE DE SEXTA-FEIRA 13


Na madrugada de 13 de julho, sexta-feira, numa pequena cidade do interior, nasceu um menino chamado Jashua. Jashua Vickson. Filho único de um casal de camponeses, o menino cresceu solitário, e suas amizades se limitaram à meia dúzia de crianças. E, com o passar dos tempos, os pais perceberam que ele parecia ser uma criança diferente.

— Tem algo de errado com Jashua — disse a mãe certo dia no café da manhã.

— Eu também ando preocupado — completou o senhor Vickson. — Às vezes tenho medo de olhá-lo. Parece que somos estranhos para ele.

A mãe assentiu, concordando.

Mas o que eles não sabiam era que ali se iniciava uma teia de horror e desgraça que ia começando, aos poucos, a se aconchegar dentro da família Vickson.

Uma semana depois o cachorro da família apareceu morto. O senhor Vickson, começou a procurá-lo em tudo o que era lugar, mas não havia sinal algum do cão. Quando subiu até o quarto de Joshua percebeu um cheiro horrível. Vistoriou o aposento até perceber que o cheiro vinha da cama. Ali, ele se abaixou e observou. Assustou-se. Ele estava lá. Tirou o cão debaixo da cama e, quando o viu, sentiu fortes náuseas. Ele tinha sido aberto ao meio. Estava sem os olhos e sem os órgãos. Furioso, senhor Vickson desceu as escadas.

— Jashua, foi você?

A mãe olhou para ele sem entender.

— Foi você? — o pai insistiu. — Responda!


— Não — ele respondeu, sério.


A época Jashua tinha 12 anos, e pela primeira vez havia matado.


Os anos foram passando, e coisas cada vez mais horríveis foram acontecendo. Teve uma noite de chuva que a senhora Vickson acordou e foi até o quarto do filho. Quando lá chegou, encontrou um gato preto crucifixado na parede, como se estivesse em uma cruz. Jashua não estava na cama. Mas, quando a mãe tentou correr e avisar o marido, encontrou o menino no corredor, olhando-a nos olhos, encarando-a como se fosse uma assombração.


Os fatos passaram e Jashua cresceu. Começou a trabalhar em uma lanchonete e, quando tinha exatamente 16 anos, apaixonou-se por Sophie. O tempo fez Jashua crer que somente ela era a mulher de sua vida e poderia fazê-lo feliz. Porém um dia, ao sair do seu trabalho, ele a avistou com outro rapaz. Furioso e fora de si, Jashua voltou para a lanchonete e pegou algo. Na rua, seguiu-os. Quando viu que o rapaz deixava Sophie em casa, ficou a espreita. Jashua viu o rapaz sair e caminhar pela rua escura, então começou a seguí-lo. Quando se sentiu hábil àquilo, partiu pra cima dele e matou-o com 48 facadas. O sangue jorrava sobre sua face e ele não sorria, só desferia os golpes, satisfeito em fazê-los.


Possuído, Jashua foi para casa carregando o nervosismo e o rancor que há anos encontrava-se escondido, e que agora, somente agora, depois de tanto tempo, se libertava.


Quando chegou, foi até o porão e pegou o machado que o pai usava para cortar lenha e entrou na casa. Subiu as escadas e parou em frente à porta do quarto dos pais. Entrou, e lá dentro ele teve coragem e sangue frio para assassinar os pais fazendo picadinho deles. Sobre a cama, os Vickson foram esquartejados por um filho que julgavam estranho, mas que na verdade era um assassino. Assim que acabou, pela primeira vez em sua vida, Jashua sorriu. Sorriu e foi para a janela. Olhou para fora, para a mata e para a chuva, e se jogou do terceiro andar. Caiu estatelado no chão. Mas, antes que se dissesse que Jashua havia morrido, ele abriu um dos olhos.


O dia era sexta-feira, 13 de agosto de 2010!