
Henrico, porém, tinha o coração duro como uma rocha. Não possui sentimentos, e sua capacidade de amar limitava-se única e exclusivamente à sedução, e usava essa sua impiedosa habilidade para exercer outra atividade totalmente contrária ao amor. O que ele fazia talvez homem algum tenha se dignado a fazer: Henrico seduzia todas as mulheres, as levava para a cama, fazia amor com elas e, por fim, as assassinava, num gesto de amor e ódio, tendo como pano de fundo um prazer duplo, que se consumia apenas com o deleite de ver o sangue escorrer.
Sua capacidade de sedução, demasiado elevada, não se comparava a nenhum outro ser. Olhos misteriosos, azuis da cor do alto mar, cabelos encaracolados e longos, que lhe caiam levemente pelos ombros, negros como a madruga, rosto desenhado pelas mãos de Deus, nariz afilado e lábios sedosos que, com qualquer movimento, derretia corações encarecidos de amor e afeto. Henrico tinha o dom de lograr de qualquer alma feminina o sentimento mais puro e encarcerado. Sua fala doce e leve, seu sorriso cheio vida, de um homem que sabe a virtude que tem, além da corpulência e aparência física, denunciavam, exteriormente, o desejo de tê-lo como amante cobiçado.
Primeiro vinha o encanto das palavras, escolhidas milimetricamente, depois as tocava como anjos tocam trombetas. O tato deixava-as ardendo em desejo e, aproveitando-se, Henrico as seduzia como somente ele sabia fazer, levando-as para cama e saboreando de cada centímetro de pele desenhada em cada silhueta que por ele passava. Por fim, as matava sem qualquer perdão, simplesmente pelo prazer de fazê-lo. Tirava a vida de toda e qualquer mulher que por ele se fazia seduzir, isso tudo por que ele não sabia amar, não conseguia amar e, desprovido de sentimentos, nutrindo uma alma rígida, um coração duro e um ar galanteador, seduzia as mulher e as matava.
A vida de Henrico seguiu assim, sem nunca ninguém ter percebido a malvadeza de sua admiração pelas mulheres. Cabe lembrar aqui que toda e qualquer mulher, por mais forte e resistente que fosse, apaixonava-se por ele, e ele, aproveitando-se da humilde intenção de tais mortais, realizava os desejos de sua alma.
Houve um momento da vida de Henrico em que tudo isso veio a despencar e a cair sobre terra. Existiu uma mulher, uma jovem e bela mulher que se instalou nas redondezas da cidade onde ele morava. Claro que ela também se sentiu atraída por Henrico e, por conseguinte, admirou-o e desejou-o até a consumação. O homem sedutor, cuja mulher nenhuma sobrevivia ao seu doentio amor, desejou, obviamente, a bela jovem. Mas, como somente o amor sabe pregar peças, na noite em que ambos estavam juntos, Henrico a seduziu com palavras, sentiu o adocicado cheiro de sua alma e a despiu com ímpeto, não fugindo de sua índole. Deitou-a na cama e, antes de fazer qualquer coisa, algo diferente o ricocheteou a alma, e por instantes, ele sentiu o coração, antes duro, doer, e, agora, súbita e inesperadamente, amolecer.
A jovem o esperava, queria ele, mas Henrico sentiu algo o invadir, e levemente começou a olhá-la com olhos diferentes. Sim, ela era bela, ela tinha um coração leve e doou-se a ele de corpo e alma. Porém ele não queria matá-la! Não queria furtar-lhe a vida e ludibriar-lhe amor. Henrico estava sentindo algo estranho, e por um leve instante de momento, quis beijá-la, abraçá-la e tê-la para si. Era estranho o que ele estava sentido e, deste modo, não fez o que estava predestinado a fazer e saiu de cima dela. Seu coração amolecera, sua alma agora se embriagava de amor. A bela jovem, sem que imaginasse, agora o fazia se apaixonar, fazendo o feitiço virar contra o feiticeiro.
Apaixonadamente perdido em pensamentos íntimos, Henrico deixou-a nua sobre a cama e saiu correndo da casa para nunca mais voltar, tanto ali quanto nas redondezas. Ninguém nunca mais soube do seu paradeiro, ele simplesmente sumira sem deixar qualquer rastro de vestígio, exceto, é claro, os corpos enganados de mulher apaixonadas que pelo sedutor se fizeram deixar levar. Há quem diga que Henrico morrera, há quem diga que seu coração se despedaçou. Eu, como fui a última a vê-lo, digo simplesmente que ele se apaixonou, não sei se por mim, mas pela vida.
2 comentários:
Finalmente um bom post nos dia dos namorados que nao falam as mesmas bobagens de sempre.
Esse conto é legal, estou seguindo.
a esquete esta enserrada, fas outra queria votar no Poe, rs
Bem diferente esse post, gostei!
Principalmente da parte que você fala que ele se apaixonou pela vida...
É o essencial!
Parabéns pelo conto, muito legal!
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