sábado, 23 de junho de 2012

DESCEU À MANSÃO DOS MORTOS



Tudo o que aqui estou prestes a contar, me foi revelado pelo próprio personagem desta história. O cidadão chama-se Wilde Parker, um senhor de quase 60 anos que hoje, por triste obra desse evento, vive num obscuro Hospital Psiquiátrico. Tive o dissabor de manter contato com ele assim que percebi que minha curiosidade me maltratava. 

Sempre fui vizinho de Parker, e lembro-me bem daquela manhã. Chovia quando acordei e vi uma ambulância e algumas viaturas da polícia em frente à casa do pobre homem. O que aconteceu nos dias seguintes não foi revelado e até hoje, cinco anos depois, a mansão misteriosamente mantém-se fechada. Contudo, no último inverno as vistas da curiosidade começaram a se abrir, e foi por fontes terceiras que descobri que Wilde Parker havia perdido a razão e seus sentidos estavam debilitados, e que depois daquela manhã ele nunca mais foi o mesmo. Descobri que ele vivia internado em um hospital para loucos e que seu estado de saúde não era dos melhores. Envolto nesse varal de noticias e nutrindo uma curiosidade que me deixava em êxtase, fui visitá-lo.

Cheguei ao hospital na primeira hora da manhã, e quando fui informar a minha real intenção de estar ali, um homem todo fardado de branco me olhou com cara de espanto e esperou alguns segundos antes de falar

– Você não deveria estar aqui neste inferno, rapaz...

Antes que eu pudesse perguntar o porquê, ele já havia saído da minha frente. Fiquei esperando por alguém, até que outro homem vestido de branco, sem expressão de sorriso no rosto, me chamou. Com ele, atravessei um corredor em meia luz, envolto de paredes descascadas e sujas. Ao fundo descemos dois lances de escadas e penetramos em um corredor mais escuro, que exalava um cheiro que pareceu me causar náuseas. 

– Você tem trinta minutos – disse o homem quando paramos em uma porta.

Ele abriu e eu entrei. Lá dentro, de costas para mim, uma silhueta encolhida jazia sentada numa pequena escrivaninha. Chamei o seu nome. O velho Parker estava desfigurado. Usava uma camisa de força branca e tinha cortes e hematomas no rosto. Sentei em uma cadeira e tentei conversar, arrancar dele toda aquela história que me mantinha cada vez mais curioso. Demorou, mas aos poucos ele falou.

Naquela noite, Wilde Parker acordou com um barulho estranho. Era como peixes se debatendo em água rasa a procura de socorro. Parker percebeu que o som vinha debaixo, então foi ai que lentamente começou a descer as escadas. Aguçando os parcos sentidos, notou que o barulho era no porão. Com cautela, ele abriu a porta que dava para a escuridão. A penumbra fisgou-o subitamente. Contudo, continuou descendo degrau a degrau, e quando enfim chegou ao último, sentiu um liquido lhe tocar os pés. Ligou o interruptor que estava ao seu lado direito. Nas palavras de Parker, o que ele viu foi assustador. O porão estava tomado por sangue, e corpos boiavam como peixes mortos. Viu o corpo de sua mulher e de seus filhos. Segundo ele, era a visão do inferno. Tomado de horror até os ossos, ele tentou subir as escadas rapidamente. Precisava de ar, de água, e quando adentrou a cozinha, o que viu na pia lhe deixou enervado em medo. Uma bacia com sangue e uma faca com lâmina afiada pingando ali descansavam. Antes que Wilde Parker pudesse fazer qualquer coisa, ouviu um grande barulho às suas costas.

– Eles estão entre nós... estão entre nós! Entre nós... eles estão entre nós!

Perguntei o que aconteceu em seguida, e a reação que Wilde Parker teve, assustou-me. Ele começou a bater com a cabeça na parede sem parar, fazendo-a sangrar. Gritei pedindo ajuda, até que dois homens apareceram e eu saí correndo dali.

Refleti sobre a assustadora – e mal contada – história de Parker. Perguntei-me, todavia, se a luz que eu via toda noite acesa na janelinha do porão daquela casa, tinha alguma coisa haver com a história, ou se também era fruto da minha farta imaginação.

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