Pensei que nunca mais fosse
vê-las. Em minha mente mergulhada em agonia e drama, imaginei que a morte me
levaria consigo para algum lugar, mas, por obra divina de alguma coisa
superior, ressurgi das cinzas, e depois de permanecer em coma profundo por
quase duas semanas, finalmente acordei
na cama de um quarto, com silhuetas vestidas de jalecos brancos e pares de
olhos que me fitavam com certo grau de atenção.
Um
dos médicos comentou comigo, assim que a consciência me despertou, que eu
estava vivo por milagre e que nem ele, nem as pessoas leigas acreditavam que eu
havia sobrevivido ao acidente. Ora, mas o que tinha acontecido comigo, afinal?
Descobri, horas depois, que eu estava voltando para casa, trazendo na bagagem
presentes para minha filha, minha esposa e meus amigos, quando o inédito
aconteceu: um caminhão desgovernado invadiu a minha pista e chocou-se
frontalmente comigo. Testemunhas relataram que meu corpo voou longe e que o
carro teve perda total. O motorista do caminhão não teve a mesma sorte que eu,
e infelizmente acabou perdendo a vida na hora do ocorrido.
Danos
internos afetaram-me e muitos dos meus órgãos ficaram danificados, o que fez
com que minha vida ficasse por um fio. Por sorte, meu quadro foi ficando estável
e começou a evoluir a cada dia. Quando fui pro quarto, eu não pensava em outra
coisa senão nas mulheres da minha vida.
Todo
esse fato me fez quase esquecer o dia dos pais, e foi então que pensei que
seria uma ótima hora para as visitas serem liberadas. Todavia, no anoitecer de
sábado o médico me deu a triste noticia de que eu ainda não poderia recebê-las.
Confesso que o desapontamento e a tristeza me pegaram de surpresa e, por fim,
deixei que o abatimento me levasse ao sono.
Devia
ser nove horas da manhã quando acordei e vi, na mesa ao lado da cama, onde
deveria estar o meu café, um lindo vaso de flores. Vire-me na cama para melhor
olhar e fiquei fitando-o, detalhando cada centímetro daquele objeto, até que,
como num estalo abrupto, avistei um bilhete entre as folhas. Estiquei o braço
com um tremendo esforço, e li o bilhete:
“Papai,
saiba que eu e a mamãe amamos muito você. Você é o melhor pai do mundo, é o meu
herói... Obrigado por existir e dar todo o carinho e amor para mim e para a
mamãe. Amanhã é o seu dia. Feliz Dia dos Pais!”
Sempre
fui um homem forte, resistente, duro demais para qualquer tipo de sentimento
leviano, mas ao acabar de ler o bilhete que minha menina havia escrito com as
suas próprias letrinhas, não resisti. As lágrimas desceram com fúria pelo meu
rosto e o soluço do choro me encheu de uma espécia de calma diferente, como se
aquele objeto tivesse me dado uma força estranha. Junto do bilhete tinha uma
foto de nós três, e ao vê-la chorei como uma criança ao imaginar a sensação de
abraçá-las novamente.
E
não demorou. Estava acabando de secar as lágrimas do rosto quando ouvi a
maçaneta da porta sendo girada. Eram elas. Minha filha veio correndo ao meu
encontro, gritando: “Papai! Papai!”. O abraço foi forte, intenso, verdadeiro.
Seu pequeno corpo estava agora entre os meus braços e nossas lágrimas se
misturavam como o encontro de dois rios. Em segundos senti mais dois braços me
tocando. Era minha mulher que começava a me acariciar e, em meio aos beijos,
disse:
- Feliz dia dos pais, meu bem.
- Achei que nunca mais veria vocês - respondi.
- Nunca pensei nisso, papai - minha filha foi dizendo. - Eu fiquei rezando por você e Deus me dizia que você não iria nos deixar. Você é o melhor pai do mundo e eu sou feliz por isso - abraçou-me. - Te amo!
Eu ainda chorava quando o médico entrou e, com um largo sorriso, falou:
- Quer presente melhor que esse no dia dos pais?
Nada respondi. Apenas sorri, deixei que as lágrimas rolassem e que as batidas do coração traduzissem o tamanho daquele sentimento que eu estava vivendo
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